segunda-feira, 14 de junho de 2010

Cindy Sherman


Quando recebi a incumbência de reconstituir algum trabalho performático na disciplina de ATAT na faculdade fiquei pensando qual performance causava em mim algum inquietação para remontá-la. Após ler o texto “Performance nas artes visuais ” de Regina Melin descobri o quão amplo é o assunto, e mais inquieta fiquei. Até aquele momento, na minha cabeça,performance deveria ser feita na rua, com a presença e interações de pessoas, jamais pensei que alguma fotos poderiam ser consideradas um trabalho performático. Mas estava lá, no texto de Regina, a frase que me fez despertar:“ (...) uma categoria sempre aberta e sem limites.” Depois de algumas aulas e pesquisas o nome de Cindy Sherman foi citado em aula por outra aluna e percebi que aquele era um assunto que me interessava. Para ter certeza fui estudar sobre ela. Cindy Sherman nasceu em 1954 em Glen Ridge, New Jersey, e vive em New York. Descobriu a paixão pela fotografia após ser reprovada nessa matéria na faculdade de Belas Artes que cursava. Alguns anos mais tarde, já trabalhando na área, começou a produzir(1978) as 69 fotos que compunham as peças dramática de “UNTITLED FILM STILL” que são tidos como um dos marcos da segunda metade do Séc. XX. Nessas imagens Sherman produz os mais diversos papéis. Calvin Tomkins fala sobre esse trabalho em “A vida dos artistas” : “ O leque de transformações é assombroso. Usando apenas maquiagens, roupas, perucas e poucos acessórios, ele consegue parecer vulnerável, sensual, desajeitada, bem arrumada, um desleixo total, gorducha, magra, durona, infantil, macilenta – todos os tipos de mulher, menos Cindy Sherman. 
Algumas personagens se baseiam vagamente em atrizes de filmes específicos, mas os detalhes são inventados, os espectadores que dizem que “se lembram’ da cena recriada estão se lembrando errado.” Tonkins ainda ressalta que o momento que Sherman fez as fotos foi após um período de calma na arte contemporânea. Uma corrente chamada Pictures surgiu numa mostra de fotografias em 1977. Sherman não participou, mas alguns de seus UNTITLED FILM STILL foram mostrados agradando os participantes. O que diferenciava ela dos outros era o seu trabalho performático. Sherman não tinha vontade de se apresentar em público, mas encontrou sua maneira de mostrar o seu lado de atriz original. Foi aí que percebi ,que de todas as performances estudadas essa era a que mais se aproxima de mim. O que eu, como atriz inquieta que sou, posso querer mais do que representar, mesmo que sem uma platéia presente, diversas personagens? E talvez justamente seja essa a dificuldade, representar sem uma platéia presente. Todas as mulheres são tão diferentes entre si, tão verdadeiras, tão reais de ontem, de hoje e de amanhã. Um plural de idéias femininas. Aí então veio a escolha das fotos. Escolhi as personagens que mais me inquietavam, não foi uma escolha ao acaso, foi uma escolha pelas imagens que mais mexeram comigo, mais me despertaram uma vontade viver e desvendar aquela mulher. Não pensei no que Cindy Sherman quis transmitir naquela foto, qual o significado que tinha pra ela, pensei o que a imagem significou pra mim, sem me preocupar com certo e errado. Aliás, isso é o mais bacana nas fotos, cada imagem é tão ampla que pra cada pessoa ela toca de uma maneira diferente, exatamente como pra mim hoje, deve ser uma performance. Respectivamente as imagens escolhidas foram: UNTITLED FILM STILL #3. ( Uma dona de casa simples na cozinha pensando no marido e nos filhos? Ou seria uma executiva preparando uma café depois de um dia exaustivo de trabalho? Uma doméstica infeliz? Uma mulher romântica preparando um jantar a dois?); UNTITLED FILM STILL #6 (Uma mulher sexy, jogada em uma cama. Será um motel com seu amante? Será uma jovem ao acordar com seu namorado depois de uma noite de amor? Será uma mulher solitária examinando sua beleza e pensando sobre o mundo?); UNTITLED FILM STILL #11 ( quem é essa mulher jogada nesse quarto? Ela chora por alguém que perdeu? Ela espera alguém que vai chegar? Ela está na sua casa depois de um encontro que teve,está na casa de seu namorado e eles brigaram, num motel de beira de estrada esperando alguém que talvez nem venha? ); UNTITLED FILM STILL #13 (quem é essa menina aparentemente ingênua que pega livros na estante? A bibliotecária da cidade? A estudante que procura um livro no escritório do seu pai? Ou será uma mulher vestida de colegial pra realizar uma fantasia do seu homem?) e UNTITLED FILM STILL #30 ( A mulher que parece ter saído de uma cena filme de terror. O medo nos olhos dela é por que ela está suplicando pela própria vida para um assassino? Ou será uma mulher que foi agredida pelo marido implorando que ele pare?)
Não existe resposta na arte da performance, muito menos no trabalho de Cindy Sherman. Como diz Lehamnn em “Teatro e Performance” : "Muitas vezes, o ator do teatro pós-dramático não é mais alguém que representa um papel, mas um performer que oferece à contemplação da sua presença no palco.” Sherman oferece justamente essa contemplação do seu trabalho de atriz, mas não no palco e sim nas fotos. Uma contemplação única, individual e profunda.


Marcélli Souza de Oliveira

Um comentário:

  1. Excelente trabalho de fotografia e realizaçao performática, que se move nas fronteiras da indefiniçao, da nao-resposta definitiva sobre algo, mas extrai uma poética a partir da indefiniçao...

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